O meio-dia e os Padres do Deserto


A literatura também se preocupou em escrever e descrever sobre o meio-dia. Encontramos a interpretação do sentido do meio-dia nos Padres do Deserto. Interpretando o salmo 91,6 que se refere a “peste que caminha na treva” e “epidemia que devasta ao meio-dia”, os Padres do Deserto associaram ao que denominaram de “demônio do meio-dia”

Para Padres do Deserto o demônio do meio-dia era o sentimento da acídia (akidía). Este termo grego pode ser traduzido como: desânimo, tédio, desengano, desgosto pelas coisas espirituais, abatimento, cansaço. A acídia provoca desestabilidade, inconstância, aversão a tudo que se encontra ao seu redor, murmuração e a perda da alegria de viver. A acídia atingia o asceta quando este, depois de ter sentido várias vezes a consolação divina, passava por uma sensação de inutilidade, pondo em dúvida todo o seu itinerário espiritual percorrido. Às vezes o “demônio do meio-dia” incitará esse homem casto e sóbrio a “recuperar o tempo perdido” na área da sensualidade ou das bebidas mais pesadas” (LELOUPE,2003, p.95).

O demônio do meio-dia é o demônio que reúne todos os demônios. É uma das tentações mais radicalmente sutis: apresenta-se, passado o primeiro entusiasmo e dinamismo do caminho espiritual, como cansaço e futilidade. A oração parece inútil e improdutiva; a prática da misericórdia fraterna parece tão longínqua como antes, encadeada aos defeitos do temperamento e do egoísmo. As paixões parecem reaparecer constantemente, sob novas formas. O espírito, cansado, insensível e opaco. A simbologia mística usou inumeráveis símbolos para expressar essa experiência clássica da maturidade humana e espiritual: a secura, a aridez, o deserto, o êxodo, a noite... Em tudo isso, a tentação fundamental consiste em ir recuperando, pouco a pouco e insensivelmente, o que foi entregue a Deus, no começo, pleno de generosidade e numa entrega total. (Sophia Perennis, 2011)

João Cassiano, um dos famosos monges do Deserto, escreveu sobre o demônio que atingia os monges na hora sexta causando-lhe vários malefícios, associando-o a preguiça e a tristeza:

Nossa luta é contra o sexto espírito de preguiça, que é ligado espírito de tristeza e ele funciona, e isso é um terrível e pesado demônio, sempre pronto a dar a batalha para os monges. Recai sobre o monge na sexta hora, causando-lhe angústia e calafrios, causando ódio em direção ao lugar onde ele está e contra os irmãos que vivem com ele e sobre seu trabalho e sua leitura das Escrituras Sagradas. Ele também sugeriu a idéia de um outro lugar e a idéia de que se você não mudar, tudo vai fadiga e perda de tempo. Além disto, você terá a fome ao redor do meio-dia, como a fome não acontece após três dias de jejum, de uma viagem longa ou fadiga extrema. Depois de vários pensamentos irão surgir, como que nunca consegue se livrar deste mal ou de peso, caso ele não freqüentemente visitam este irmão, para ganhar uma vantagem, é óbvio, ou visitando os doentes. Quando o mongeo está vinculado por estes pensamentos, então mergulhado em um sono profundo, tornando-se ainda mais violento e forte sentimento contra ele, e não se assuste se não for através da oração , evitando o lazer com a meditação da palavra divina e resistência à tentação. Porque se esse espíritoo encontrar o monge defendida por essas armas, acerta com suas flechas e torna-se instável, agitado, ele se torna lento e preguiçoso, induzindo-o a viajar vários mosteiros, não se preocupando, não procuram nada além de lugares onde comer e beber bem. Porque o espírito de preguiça só pensa no presente ou no entusiasmo que vem dessas coisas. E, neste ponto, o diabo envolve em assuntos mundanos, e pouco a pouco nos envolvemos com essas ocupações perigosas, até que o monge rejeita completamente seus votos monásticos (Apud: SOPHIA PERENIS,2011 )

2 comentários:

Deserto Interior disse...

Belíssimo artigo Frei Rufino.
Que os Padres do Deserto nos ensine sempre mais buscar a santidade através de sua espiritualidade.
PAZ E BEM!!!

Anônimo disse...

Um monge vivia no deserto há 50 anos. Um dia ele estava no topo da menor e única elevação topográfica daquela vastidão nivelada, erma e ignota. Era a menor, não passava de um pequeno monólito de 2m de altura. Um ilustre, destemido, súbito e fugaz visitante o divisou de longe porquanto transmutou-se como que alguém minúsculo no topo de uma grande montanha configurada na relatividade da imensidão aberta e silenciosa daquele deserto no Egito. O visitante aproximou-se. Os 2 se fitaram, o visitante tinha um olhar de busca de fogo, o monge sereníssimo. Os 2 ficaram em silêncio alguns segundos. Os ponteiros do intelecto do visitante foram a mais de mil, quando o monge irrompe o silêncio que demorou uma eternidade e diz: "me diga uma coisa, Alexandria ainda existe?"...:)