O USO DA CRUZ NA CONTEPORANEIDADE


Os cristãos costumam usar uma cruz para lembrar aquilo que Jesus disse: “Se alguém quer me seguir, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me” (Mc 8,34). A cruz tornou-se, na história, o símbolo de maior representação do cristianismo. No entanto, na contemporaneidade, há um esvaziamento do sentido teológico da cruz, quando a mesma é usada como um simples sinal estético ou supersticioso.

O teólogo Luterano, Westhelle (1998) em sua obra “O Deus Escandaloso, o uso e abuso da cruz”, faz uma crítica ao desvirtuamento do sentido da cruz ao logo da história do cristianismo. Segundo ele o uso excessivo da cruz acabou por ocultar a realidade chocante da cruz.

A crítica de Westhelle continua atual. Percebemos o uso exagerado da cruz na contemporaneidade sem a devida compreensão do seu sentido teológico-espiritual mais profundo. É comum encontrarmos pessoas usando a cruz como uma simples peça de bijuteria pendurada no pescoço ou na orelha. Constata-se uma vulgarização cruz, pois mesmo pessoas que não acreditam em Jesus passam a usá-la. Muitos carregam uma cruz no peito, mas negam em seus corações a mensagem da sua doutrina.

A própria cruz, em lugar do que nela aconteceu há 19 séculos, se tornou o centro da atenção, resultando em vários erros graves. O próprio formato, embora concebido por pagãos cruéis para punir criminosos, tem se tornado sacro e misteriosamente imbuído de propriedades mágicas, alimentando a ilusão de que a própria exibição da cruz, de alguma forma, garante proteção divina (HUNT, A finalidade da cruz, 2011).

O uso da cruz como simples adereço e não como símbolo de fé acaba por ofuscar ou anular o sentido da linguagem da cruz de Cristo (cf. 1Cor 1,17). Para Dinkler (1998) o uso excessivo do símbolo da cruz traz conseqüências.

Estamos atualmente [...] tão acostumados ao símbolo da cruz – seja como um símbolo do cristianismo ou como um símbolo do humanismo secular como na Cruz Vermelha ou na Cruz Azul ou inclusive como um emblema político – que o aspecto escandaloso nela e o escândalo em si não mais parece nos atingir (DINKLER, In: Westhelle, 1998, p. 25).

Mendonça (2011), sacerdote católico, responsável pela relação da Igreja de Portugal com a cultura, em entrevista a Ecclesia, agência de notícias da Igreja Católica de Portugal, fez a seguinte constatação:

A cruz é uma linguagem paradoxal e também uma interpelação. É verdade que o pior que pode acontecer é quando ela se torna ornamento, quando a trazemos ao peito como trazemos um outro símbolo qualquer a que não damos importância. Hoje os cristãos continuam a fazer a cruz sobre o seu corpo, e muitas vezes fazem-no de forma mecânica. Isso é triste porque é diminuir e dispersar o sentido de levantamento que a cruz tem. O sentido da cruz é sempre paradoxal. É ambíguo porque tem a ver com a história de sofrimento e rejeição que Jesus protagoniza e tem a ver com a história do dom que ele exemplifica e testemunha (MENDONÇA, Jesus continua a ser uma pergunta fundamental no coração humano, In: ECCLESIA, 2011).

A cruz mais do que um simples objeto é mistério de redenção. Nela se desvela uma mensagem de salvação ao qual o homem contemporâneo é convidado a aderir. Usar a cruz sem compreender e aceitar seu verdadeiro sentido acaba por ofuscar o sentido mais genuíno da linguagem da cruz.

Nenhum comentário: