A MULHER NO CRISTIANISMO PRIMITIVO

Há um adágio popular que diz: “por trás de um grande homem existe sempre uma grande mulher”. Este adágio pode ser aplicado à vida dos grandes personagens do cristianismo primitivo, como: Jesus e Paulo.

As mulheres não estiveram apenas por trás desses homens, mas estiveram ao lado deles, colaborando de forma efetiva e afetiva com seus projetos missionários. Os evangelhos apresentam uma lista de mulheres que colaboraram com Jesus em suas necessidades, cujos nomes não foram esquecidos: Marta e Maria (Lc 10,38-42), Maria Madalena, Joana e Maria mãe de Tiago e tantas outras cujos nomes não conhecemos (Lc 24,10-11). Segundo o evangelista Mateus, essas mulheres “haviam acompanhado Jesus desde a Galiléia, a servi-lo” (27,55). Eram mulheres corajosas, discípulas fiéis. Como Maria de Nazaré, permaneceram de pé ao lado de Jesus Crucificado (Jo 19,25).

A vida e missão do apóstolo Paulo foram marcadas pela presença e colaboração de ilustres mulheres. Em seus escritos, Paulo não deixa de mencionar as suas colaboradoras: Febe, diaconisa da Igreja de Cencréia (Rm 16,1), Prisca, mulher que arriscou sua vida pelo apóstolo (Rm 16,3), Maria, que muito contribuiu com Igreja de Roma (Rm 16,6), Júnia, parente e companheira de prisão, denominada de apóstola (Rm 16,7), Trifena, Trifosa, Pérside, que se afadigaram no Senhor (Rm 16,12), Júlia (Rm 16,15), Evódia e Síntique, membros importantes da comunidade de Filipos (Fl 4,2). Os Atos dos Apóstolos faz referência a Lídia, que ao escutar a pregação de Paulo, converteu-se. Sua casa se tornou o berço de acolhimento de Paulo e do nascimento da comunidade de Filipos (At 16,14-15.40). “Lídia é talvez exemplo típico e primeiro de um modelo constante pelo qual ricas e ilustres mulheres atuavam como benfeitoras e protetoras do movimento cristão inicial” ( BYRNE, 1993).

Apesar de Paulo mencionar, agradecer o contributo de inúmeras mulheres, uma visão unilateral e descontextualizada de seus escritos, o acusa de ser o teórico do silêncio das mulheres na assembléia cristã (1Cor 14,34-35; 1Tm 2,11-12 ), da proibição de “não tocar em mulher” (1Cor 7), da restrição das vestes das mulheres na assembléia (1Cor 11,2-6; 1Tm, 2,9-10), da inferioridade da mulher em relação ao homem (1Cor 11,7-11) e da submissão das esposas aos maridos (Cl 3,18; Ef 5,21). Tais interpretações trouxeram conseqüências negativas na caminhada eclesial.

A partir de uma interpretação meramente fundamentalista dos escritos paulinos tem se justificado a não participação das mulheres em alguns ministérios da Igreja e legitimado uma sociedade baseada nas relações patriarcais. Ao longo do percurso histórico da humanidade a mulher foi condenada a viver no anonimato. Seu espaço foi reduzido ao lar, sendo-lhe negado o direito de exercer sua cidadania plena. Muitas atitudes de exclusão e descriminação da mulher são sustentadas e defendidas com bases em ideologias que vêem as mulheres como simples objetos de “cama e mesa” (mucama). Convém lembrar que essas ideologias foram alimentadas e formuladas a partir de uma visão distorcida de autores cristãos, como o apóstolo Paulo.

Com base em estudos mais profundos dentro do seu contexto original é possível ter uma visão positiva dos escritos paulinos e absolver São Paulo das acusações, tais como: de ser o defensor da função secundária da mulher nos ministérios da comunidade eclesial e de seu papel de subordinada na relação matrimonial. Recordemos algumas frases célebres de seus escritos:

“Entretanto, diante do Senhor, a mulher não existe sem o homem e o homem não existe sem a mulher. Pois, se a mulher foi tirada do homem, o homem nasce da mulher, e tudo vem de Deus” (1Cor 11,11-12). Neste texto, Paulo estabelece a mútua dependência entre homem e mulher e supera a relação de superioridade do gênero masculino sobre o feminino;

“a cabeça da mulher é o homem” (1Cor 11,3). Quando Paulo faz essa afirmação não se trata de uma defesa da autoridade homem sobre a mulher. O termo cabeça (kephale) pode ser traduzido em seu sentido metafórico como fonte. Neste sentido, compete ao homem como fonte, nutrir, fortalecer para que a mulher encontre sua vitalidade plena. A autoridade do homem não é de se colocar na posição de superior, mas deve ser aquele que é responsável por cuidar da mulher;

“Quando estais reunidos, cada um de vós pode cantar um cântico, proferir um ensinamento ou revelação, falar em línguas ou interpretá-la, mas que tudo se faça para a edificação!” (1Cor 14,26). Nesta exortação, ao tratar sobre os vários carismas que os cristãos de Corinto deveriam colocar a disposição para contribuir com a comunidade, Paulo usa a expressão: “cada um de vós”. Nesta expressão, Paulo não identifica que sejam apenas os homens os detentores da palavra na celebração da comunidade;

“Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,28). Nesta bela passagem paulina, há uma proclamação da superação das diferenças entre raça (judeu e grego), de classe social (escravo e livre) e de sexo (homem e mulher). Para Paulo, em Cristo existe uma unidade de todos os batizados, o que estaria excluída qualquer relação de privilégios de um sexo sobre o outro. Entre ambos não deve haver relações de denominadores e dominados, subordinadores e subordinados, mas de companheirismo.

Uma leitura contextualizada dos escritos paulinos nos permite pensar de forma diferente acerca da relação entre homem e mulher na sociedade contemporânea. A mulher tem conquistado posições elevadas na esfera social e religiosa. Na esfera social, a mulher tem assumido os mais diversos serviços profissionais. Na esfera religiosa, a mulher tem encontrado o seu lugar nos diversos ministérios. Em algumas Igrejas Cristãs encontramos ainda mulheres exercendo o ministério da pregação e do pastoreio. Tais avanços no cristianismo atual podem ser atribuídos a uma interpretação mais genuína do pensamento de Paulo.

Com relação ao pensamento de Paulo acerca das mulheres, guardemos como sua última palavra a seguinte afirmação: “todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,28b).


PARA REFLETIR:

- Você tem dado o devido valor à mulher?


Referência:

BYRNE, Brendan. Paulo e a mulher cristã. São Paulo: Edições Paulinas, 1993.

2 comentários:

Celina Missura disse...

Gostei do seu blog. Parabéns

Celina Missura disse...

Gostei do seu blog. Parabéns